Transplante de Órgão e Tecidos
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No dia 7 de janeiro de 2022 aconteceu um fato, até então inédito no mundo, uma cirurgia de transplante de coração usando o órgão de um porco geneticamente modificado em um humano. Desde então, muito se comenta sobre o assunto, e sabemos que muita gente vem se perguntado, como isso pode ser possível.
Se você também está curioso para entender melhor sobre transplante de órgãos e tecidos e como chegamos até este momento, aproveita que o Bioinformando vai te informar direitinho sobre o assunto
COMO TUDO COMEÇOU?
A ideia de transplantar um órgão ou tecido para outro ser já fazia parte do imaginário dos povos desde as mais antigas civilizações. Nas antigas Grécia, Roma e China já existiam mitos sobre transplantes de órgãos realizado por deuses e curandeiros com relatos fantasiosos envolvendo cadáveres ou animais.
Não se sabe exatamente quando surgiu a primeira tentativa de transplante de órgãos e tecidos, no entanto, escrituras milenares como o Rig Veda, com passagens geográficas e etnológicas que evidenciam que foram escritas por volta de 1700 a 1100 a.C. já considerava o transplante de órgãos. A obra é considerada o mais antigo escrito indiano conhecido sobre as tipologias humanas e é uma das bases da Medicina Ayurvédica.
As primeiras experiências de transplante de órgãos, tinham foco em reparar mutilações. Há relatos de que por volta de 800 a.C. médicos indianos começaram a realizar enxerto de pele para reparar feridas e queimaduras. Lendas religiosas cristãs também falam deste tema e a mais célebre delas é a dos gêmeos São Cosme e São Damião, que viveram entre os anos 285 e 305 d.C. A lenda conta que os irmãos usaram a perna de um etíope recém-falecido em um cristão que estava com a perna necrosada. Por causa desse milagre, ambos são considerados os padroeiros da medicina e dos transplantes. O dia 27 de setembro é comemorado no Brasil como o dia dos padroeiros, sendo considerado pela Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (ABTO), como o Dia Nacional do Doador em 1999 e, posteriormente, publicada a lei 11.584 de 27/11/2007 pelo Governo Federal, instituindo a comemoração Dia Nacional da Doação de Órgãos todo dia 27 de setembro de cada ano.
Durante séculos, o transplante de órgãos foi objeto de muitas tentativas, porém, o desconhecimento dos fenômenos biológicos envolvidos na interação do receptor e a falta de técnicas importantes foram obstáculos que levaram muitos pesquisadores a buscar soluções. O pesquisador que mais se destacou, na época, foi Alexis Carrel que aperfeiçoou suas técnicas e desenvolveu o método de triangulação de sutura, uma conquista importante para a realização de transplantes. Em 1902, Carrel publicou o clássico artigo “La technique operatoire des anastomoses vasculaires et la transplantation des viscères”, este método ainda hoje é utilizado em cirurgias vasculares.
Mas, apesar do grande avanço na técnica cirúrgica com a contribuição do método de Carrel, ainda existia a barreira do desconhecimento dos fenômenos biológicos e, em 1914, em uma palestra na Associação Internacional de Cirurgiões, Carrel aborda a importância de pesquisar métodos biológicos para o futuro dos transplantes:
“O aspecto cirúrgico do transplante de órgãos está resolvido. Somos capazes de realizar transplantes com facilidade e com excelentes resultados do ponto de vista anatômico. Mas estes métodos não podem ainda ser aplicados a humanos, visto que são quase sempre malsucedidos do ponto de vista da função dos órgãos. Todos os nossos esforços devem agora ser direcionados para os métodos biológicos que prevenirão a reação do organismo contra tecidos estranhos e permitirão a adaptação do enxerto ao seu hospedeiro.” (Carrel, 1914)
Os estudos para ultrapassar a barreira do desconhecimento de métodos a nível biológico que pudessem prevenir a reação do organismo contra esses tecidos estranhos começaram a ser ultrapassados durante a Segunda Guerra Mundial quando Peter Medawar e Thomas Gibson realizaram experimentos com transplantes de pele em pessoas com queimaduras, descrevendo o processo de rejeição e de não-rejeição ao utilizar enxerto de outro indivíduo e do mesmo indivíduo, respectivamente. Esses experimentos demonstravam que se tratava de um evento imunológico, despertando o questionamento: por que não proteger o órgão enxertado enfraquecendo o sistema imunológico?
É importante destacar que neste período da Segunda Guerra, além do avanço nos estudos dos enxertos cutâneos outros estudos se desenvolveram bastante, como por exemplo a terapia com antibióticos, as técnicas de transfusões sanguíneas, a anestesia, a obtenção de frações de plasma, as anastomoses vasculares primárias para lesões arteriais e a diálise, e tudo isso contribuiu para estimular o desenvolvimento dos transplantes.
A partir desse questionamento, testes em animais começaram por volta de 1950 principalmente com a tentativa de transplante de rim em pacientes com uremia acreditando que a imunidade alterada da insuficiência renal poderia ser suficiente para permitir a sobrevida do enxerto. Em 1951 foram registrados na França os primeiros transplantes utilizando rim de doador vivo na história do transplante renal realizado por Rene Küss em Paris.
Desde então, diversas tentativas de transplantes em várias partes do mundo foram realizadas, e cada vez mais as técnicas foram se aperfeiçoando, assim como a necessidade da ampliação do conhecimento sobre as implicações do sistema imunológico neste processo para que fosse possível salvar vidas não só daqueles com sistema imunológico idêntico. Para isso ser possível foi preciso desenvolver estudos sobre a tolerância, a imunossupressão e a histocompatibilidade que é basicamente a compatibilidade ou equivalência entre células, tecidos e órgãos.
Foi a partir do lançamento das bombas atômicas no Japão, em 1945, que passaram a estudar os efeitos da radiação no corpo humano, sendo possível observar que o sistema imunológico era afetado dependendo da quantidade de radiação, levando a supor que com a radiação poderiam ultrapassar essa barreira imunológica para os transplantes de órgãos.
Após várias experiências em animais, um grupo de Boston, liderado pelo Dr. Joseph Murray e Dr. David Hume no Hospital Brigham, usou métodos de irradiação corporal e reposição da medula como preparo para o transplante em 12 pacientes que não eram geneticamente idênticos com os doadores. Dos 12 pacientes, apenas o jovem John Riteris de 26 anos, que recebeu o rim do irmão gêmeo em 24 de janeiro de 1959, sobreviveu, e ficou conhecido como o primeiro ser humano em que a barreira imunológica foi quebrada, levando uma vida normal e saudável até a sua morte, em julho de 1979, por insuficiência cardíaca.
AVANÇOS APÓS O PRIMEIRO TRANSPLANTE COM SUCESSO
Na década de 60, o transplante de rim passou a ser uma prática comum no tratamento da insuficiência renal, abrindo as portas para as tentativas de transplantes com outros órgãos como fígado, coração, pulmão, pâncreas e intestino. Porém, era preciso ampliar os estudos de drogas imunossupressoras para que houvesse uma evolução satisfatória no transplante de outros órgãos.
Ao longo de três décadas (1955 a 1985) inúmeras drogas imunossupressoras foram sendo introduzidas com o intuito de aumentar a sobrevida dos transplantados, ao reduzir o índice de rejeição. Em 1976, foi descoberto por Jean-François Borel os efeitos imunossupressores da ciclosporina que teve sua introdução na prática clínica por Roy Calne, em 1978, dando início a uma revolução nos transplantes na década de 1980, aumentando a sobrevida dos pacientes de transplantes cardíacos em 75 a 80%.
No Brasil, assim como no mundo, foi a partir da aplicação clínica da ciclosporina como medicamento imunossupressor, no início dos anos 80 que reativaram programas para transplante cardíaco, hepático e pancreático, assim como um programa precoce de transplante pulmonar instituído já no final dessa mesma década.
É claro que, à medida que a ciência avançou neste campo da saúde, aspectos políticos, éticos e sociais foram surgindo sendo necessário regulamentar o processo de transplantes. No Brasil, a regulamentação do processo de transplante pode ser dividida em três fases e vamos abordá-las a seguir.
A primeira fase se estendeu de 1964 a 1987 e referia-se à demanda e alocação de órgãos sob responsabilidade dos centros de transplantes e, até então, sem controle do Ministério da Saúde.
Já na segunda fase que começou em 1987, o Ministério da Saúde lança o Sistema Integrado para o Tratamento do Paciente Renal Crônico e do Transplante Renal (SIRC-TRANS), visando estabelecer padrões para reconhecimento e funcionamento de centros de transplante renal e para determinar os pagamentos pelo sistema público de saúde.
Ainda na segunda fase temos a proibição da venda de órgãos pela Constituição de 1988, sendo posteriormente regulado pela lei de transplantes de 1992 (Lei n° 8.489). Essa lei apenas foi regulamentada em 1993, por meio do Decreto n° 879, de 22 de julho, que tornou obrigatória a notificação, em caráter de emergência, de todos os casos de morte encefálica. Nesse mesmo período, o Ministério da Saúde criou o Sistema Integrado para Procedimentos de Alta Complexidade (SIPAC) para transplante renal, hepático, cardíaco, pulmonar e de medula óssea estabelecendo mecanismos de controle de qualidade para centros de transplantes, além de determinar os valores a serem pagos para esses procedimentos.
E, por último, temos a terceira fase que começou em 1998 com o gerenciamento e os pagamentos envolvidos em todos os processos de doação e transplante se tornando responsabilidade do governo federal, além de uma nova legislação sobre transplantes e a criação do Sistema Nacional de Transplantes (SNT). Em 1999, o Centro Nacional de Notificação, Captação e Distribuição de Órgãos (CNNCDO) foi criado e ficou responsável pela distribuição de órgãos entre todos os estados. Em 2000, com base no modelo espanhol e por solicitação da Associação Brasileira de Transplante de Órgãos, um Hospital Coordenador de Transplantes foi criado. Posteriormente, esta instituição ficou conhecida como Comitê Intra-Hospitalar para Doação de Órgãos e Tecidos para Transplante (CIHDOTT) e passou a ser utilizada na maioria dos estados.
O número de transplantes só aumentou após o estabelecimento de uma política de transplante no Brasil, tornando o país o terceiro do mundo a realizar transplante de renais em 2005 quando foram realizados 3.362 transplantes dessa modalidade, ficando atrás apenas dos EUA e da China. Em 2006, o Brasil ocupava o 5° lugar, na América do Sul, na realização de transplantes, atrás apenas do Uruguai, Argentina, Chile e Colômbia.
O TRANSPLANTE DE ÓRGÃOS NA ATUALIDADE
Como vimos, percorremos um longo caminho e a ciência nos permitiu inúmeros avanços nos transplantes de órgãos e tecidos. No entanto, ainda temos uma barreira a ser superada que é a imensa fila de espera por um órgão no Brasil e no mundo. Em setembro de 2021, O Ministério da Saúde anunciou que mais de 53.000 pessoas aguardam na fila de espera por um órgão ou tecido, sendo a espera por um rim sendo a fila mais longa com 31.125, seguida de 19.115 pessoas esperando por um transplante de córnea, 1.905 por fígado, 387 aguardando um transplante duplo de pâncreas e rim, 365 de coração e 259 de pulmão.
Apesar dos números, o Brasil tem o maior sistema público de transplante do mundo, e o Ministério da Saúde colocou como meta aumentar o número de identificação dos casos de morte encefálica, pois atualmente, cerca de 23% dos casos não são identificados.
Confira alguns dados atuais (2021) da estrutura de sistema público de transplante de órgãos e tecidos do Brasil:
- 1 Central Nacional de Transplantes;
- 27 Centrais Estaduais;
- 648 Hospitais de Transplantes habilitados;
- 1.253 Serviços de Transplantes habilitados;
- 1.664 Equipes de Transplantes habilitadas;
- 78 Organizações de Procura por Órgão (OPO);
- 516 Comissões Intra-hospitalares de doação de órgãos e tecidos para transplantes;
- 52 Bancos de Tecido Ocular;
- 13 Câmaras Técnicas;
- 12 Bancos Multitecidos;
- 48 Laboratórios de Histocompatibilidade.
Já deu para perceber que a ciência não para e, atualmente, a comunidade científica se esforça para viabilizar o xenotransplante (transplante envolvendo diferentes espécies), dessa maneira, não teríamos filas imensas na espera de um órgão.
A boa notícia, é que com os avanços nos estudos da genética, é possível editar genes, e foi isso que possibilitou a cirurgia de transplante de coração de porco em David Bennet. Ele recebeu um coração de porco com quatro genes desativados e seis genes humanos inseridos no intuito de “enganar” o sistema imunológico para que este não rejeitasse o coração transplantado.
O paciente passou pelas 48 hs de maior perigo de rejeição com o seu novo coração e sobreviveu por dois meses. Apesar da morte de Bennet, que já sofria de uma cardiopatia grave terminal, a equipe médica responsável encara a cirurgia de forma promissora, pois conseguiram provar que um coração de animal geneticamente modificado pode funcionar no corpo humano sem rejeição imediata.
Referências:
Seara de Asclépio : uma visão diacrônica da medicina [Recurso eletrônico]/ Joffre Marcondes de Rezende; Vardeli Alves de Moraes; Gil Eduardo Perini. – 2. ed. – Goiânia : Editora UFG, 2018.
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